quarta-feira, 7 de março de 2012

6# Manual do CorrupUto - Como conseguir verbas.


Em um País estranho, o velho político ensina sua arte ao seu jovem correligionário novato. 
Meu filho, vou abrir seus olhos, governar ficou fácil. No fundo, todo mundo sabe o que Fazer para ter um País melhor. A dificuldade até agora era onde conseguir a verba para Fazer. E o mais importante, verba para receber o “faz me rir” extra motivacional. Mas nós aprendemos a resolver esse pequeno problema.
Eureka! 
Se não tem dinheiro para Fazer, basta tirar da conta do pacato cidadão. Dá para fazer isso em todas as esferas de governo.
Como? 
Usando o talento e a imaginação, inventando uma nova contribuição, taxa, pedágio, imposto ou afins. A fonte é o pacato cidadão eleitor.
Já tem o IPTU, o ICMS, o ISS, o IPVA, e o IR entre outros. Uma sopa de letrinha, um monte sem fim de siglas extraindo verba direto das veias do cidadão em direção dos cofres públicos. 
E das nossas cuecas. 
Novato: então já tem dinheiro de sobra para Fazer o que importa, investir em saúde, educação, moradia e segurança e ainda, e não menos importante, algum para os extras?
Devia ser assim. Mas não é.
Esses impostos básicos mal pagam os salários 
e os mimos para a própria máquina pública.
Então, para que a gente receba a justa remuneração por bons serviços prestados, é preciso estar sempre criando algum novo imposto. 
De preferência sem chamar de imposto. Podemos batizar de  “contribuição”, “taxa” ou “pedágio”.
Tudo imposto, nada voluntário.
E o novato pergunta:
- mas o povo vai acreditar?
Depende da embalagem. É necessário enfeitar. 
Por exemplo, já tem o IPVA, mas, nós, políticos dedicados, queremos mais. 
Queremos pedágios, vários, muitos. No Estado e em breve, no Município. E o que alegamos? 
É pela qualidade nas estradas. As melhores estradas são as pedagiadas, portanto os pedágios existem para nossa segurança! E ninguém duvida. Quem é contra a segurança nas estradas?
E como garantimos a necessidade dos pedágios? Não investindo o arrecadado em impostos nas estradas não pedagiadas, deixando-as abandonadas. Quanto mais acidente melhor. Quanto mais tragédias, melhor.
E ainda ganhamos um financiamento extra para campanhas, bondade e gratidão das empresas que integram os consórcios que administram as estradas sob concessão. E como eles concedem para as campanhas meu jovem!!
Novato: Genial! 
Não temos custo com as estradas, 
ganhamos dinheiro das concessionárias
e o povo ainda paga pacificamente por ser para a  sua segurança 
e ainda votam em nós de novo!
Verdade. Mas o governo federal tem atrapalhado. Está criando umas estradas pedagiadas com pedágio muito barato. A ideia dele é a mesma, mas pensa pequeno, ganha bem menos e isso nos expõe.
Mas, por fim, transformamos custo em receita e o povão aplaude. 
Tudo pela segurança. 
Segurança da nossa conta.
Mancada foi o que aconteceu com a CPMF.
Era perfeita! O P de provisória já estava virando P de Permanente!
Desviávamos o IR que deveríamos investir na saúde para outros fins. Se é que você me entende.
E o povão pagava satisfeito, tudo em nome de um melhor sistema de saúde pública.
Que criatura maligna diria não para a saúde pública?
O sistema de saúde nem melhorou na época em que a CPMF vigorou, e usamos a grana para fins mais nobres. A minha parte está até onde a vista alcança a partir da sede de minha fazendinha. 
Entendeu agora porque não é interessante melhorar o serviço público de saúde para o povão?
Além disso, não sou eu e nem você quem vai parar em hospital público.
E ainda estimulamos os serviços de convênios médicos. Sempre é bom um pouco mais de verba para a campanha.
Mas por questiúnculas egoístas, puseram fim na saudosa CPMF. Por enquanto, estamos na luta pela volta dela! Saúde é prioridade!
Mas tem que ter o jeitinho. Se não o tiro sai pela culatra. 



A Marta, por exemplo. Fez quase tudo certo. Propôs uma nova taxa, disse que sem ela seria o caos, que era para o próprio bem da cidade.
A taxa do lixo, sem ela seria o caos e São Paulo não teria onde colocar seu lixo. Muito bem argumentado. Quem quer lixo nas ruas atraindo doenças?
Mas era época de campanha. Os adversários usaram a proposta como munição contra ela.
Depois...
Não veio a taxa, nem o caos.
O tempo desmascarou e taxou ela mesma. Ficou taxada de MarTaxa.
Tem que fazer com cuidado.
Já o Gilberto faz com maestria.
Soube criar uma  nova taxa. Os bons motivos alegados: combater a poluição do ar, permitir que o cidadão respire melhor.
Como?
Inspeção veicular.
Quem paga? O IPTU ? O IPVA? O pedágio? Que nada!
Quem paga é o pacato cidadão.
E adivinha se o consórcio que faz a inspeção não é parceiro na hora do financiamento de campanha!
E não para por aí.
Vem aí o Pedágio Urbano.
Motivo: ter dinheiro para investir na melhoria das vias públicas e aumentar a mobilidade urbana.
E ainda dizemos que é uma cobrança seletiva.
Só paga quem usar a via pedagiada.
Muito bom isso!
Dá para dizer isso de vários impostos. A CPMF, por exemplo, só pagava quem tinha conta corrente. Povão amava.
É só não deixar o povo perceber que produtos e serviços ficam mais caros para todos em consequência disso. 
Mas há possíveis variações sobre o mesmo tema. Multas são uma forma de imposto. Mas a multa realmente é seletiva. É punição. E a ideia é sermos bonzinhos com os multados. Certa vez o TCU  divulgou que um montante enorme de multas aplicadas por órgãos governamentais simplesmente não eram cobradas. Deixava-se de arrecadar uma dinherama! Mas não somos bobos.
As multas eram cobradas.
Dávamos um desconto amigo,
e para evitar burocracia, o valor ia direto para a conta dos nossos homens.
Todo mundo ficava feliz. 
É o que a imprensa chama criativamente de "indústria da multa". 
Sim, quanto mais multarmos, mais dinheiro nos cofres.
E também usamos os argumentos nobres. Reduzir velocidades ou combater o excesso de velocidade aumenta a segurança. E a cada dia reduzimos mais o limite de velocidade. 60, 40, 20 quilômetros por hora, de forma que o motorista leve multa sem perceber.
E, quando as coisas apertam, simplesmente multamos uma placa  qualquer de algum inocente. O motorista pode recorrer, mas dá tanto trabalho e gasto que acaba concluindo que é mais fácil pagar a multa e pronto. Imagine isso multiplicado por dezenas ou centenas.

Outra estratégia é a técnica Demóstenes. Nos tornamos aliados de um grupo de interesses. Defendemos esses interesses no Congresso e recebemos incentivos desses grupos em forma de presentes ou espécie. Ou de bilhete premiado. Uma mão lava a outra.

A iniciativa privada também gosta do sistema.

Em nome da sustentabilidade foi preciso criar uma legislação para dar destino certo às lampadas fluorescentes, que contém mercúrio. O governo fez um acordo com as empresas. Elas fazem o trabalho e aumentam o preço das lâmpadas. O consumidor mais uma vez paga o pato. Imposto.

Veja os supermercados. Gastavam um dinheirão para produzir e distribuir gratuitamente as sacolinhas plásticas. Em nome da sustentabilidade eliminaram as sacolinhas. E as sacolas retornáveis são gratuitas? Não, claro que não. Quem paga por elas? O consumidor! Transformaram despesa em lucro! 


E nem falei do clássico superfaturamento de obras e serviços! Nós e os promissores empresários acrescentamos uma taxa de bons serviços prestados às licitações.


Novato: mas o pacato cidadão consumidor eleitor não é uma fonte que um dia vai secar?

O pacato cidadão é uma fonte inesgotável. Só deixará de ser quando for mais cidadão e menos pacato. Vai demorar muito para isso acontecer.
Meu caro amigo, 
caros impostos são a solução.

V8 Se quiser me processar, desde ja afirmo que esta é uma história de ficção. Qualquer semelhança com nomes ou acontecimentos reais é mera coincidiência.

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